Ontem, entre um café e um desabafo, ouvi de um velho conhecido da prefeitura de Porto Seguro uma frase que resume bem o atual estado das coisas na terra mãe do Brasil: "Votei duas vezes no prefeito, acreditei nele, e agora não reconheço mais a cidade". O homem, servidor de carreira, concursado, trabalha de verdade. E estava visivelmente inconformado. Com razão.
Segundo ele, a administração municipal virou um pasto para fantasmas: cerca de 1.500 ilustres "amigos do rei" recebem salários entre R$ 3 mil e R$ 10 mil mensais sem precisar enfrentar fila de ponto ou sequer aparecer na repartição. Entre eles, advogados, aposentados, malandros profissionais, e até empresários que juram à boca pequena que "nem sabiam que têm cargo". Está tudo registrado, tudo escancarado, é só conferir a lista dos "agentes políticos" no portal do TCM. Mas segue tudo funcionando. Ou melhor: desfuncionando.
A pergunta veio direta: "Você vê alguma saída para isso? Alguém que possa mudar esse quadro?" Tive que ser honesto. Não vejo. Não por ceticismo barato, mas por conhecer a realidade eleitoral do lugar, .
Porto Seguro, essa cidade que um dia teve raiz, hoje virou uma espécie de encruzilhada identitária. Gente do Brasil inteiro, valores de lugar nenhum. E onde não há identidade, tampouco há freios morais. Especialmente na política.
O PREÇO DE UMA ELEIÇÃO
Para quem não sabe ou não tem noçao, uma campanha séria para prefeito não sai por menos de R$ 20 ou R$ 30 milhões. E não se trata de achismo da minha parte. Trata-se de matemática eleitoral. Investe-se isso para "ganhar" o direito de faturar algo em torno de R$ 300 a R$ 500 milhões em 4 anos. Isso de "lucro", claro! Como diria o ex-prefeito Ubaldino Júnior, gênio prático da política baiana: "Antes de reunir o povo, reúna o dinheiro".
O candidato sóbrio, honesto e bem-intencionado não sobrevive. Primeiro porque não tem cacife para alugar partido (e são todos de aluguel), depois porque não tem caixa para bancar vereador, comitê, gasolina, gráfica, cabos, palco, som, "imprensa". No fim, vai ter que pagar também o voto direto. E é aqui que tudo se revela: se o sujeito gastar 30 milhões para, em quatro anos, receber R$ 1,2 milhão de salário, você realmente acredita que ele vai governar pensando no povo? Só acredita em Papai Noel quem quer!
Das duas, uma: na melhor das hipóteses, sai rico. Na pior, sai processado. Salvo-conduto para improbidade é privilégio de poucos, e depende muito mais do humor de quem fiscaliza do que da letra da lei. E como fiscalização, no Brasil, também tem CEP e sobrenome, há quem nem precise se preocupar.
Veja o caso, por exemplo, de um certo promotor da região que adora posar de xerife junto aos prefeitos e prefeituras do Extremo Sul. Seus parentes faturam fácil R$ 200 mil por mês com "assessorias jurídicas" prestadas às mesmas prefeituras que ele fiscaliza. Sem licitação, sem pudor, sem repressão. Nem do Ministério Público, nem da Corregedoria, muito menos da OAB. Ninguém levanta um dedo. A impunidade virou uma arte.
E assim seguimos. Em Porto Seguro, ou o prefeito se adapta ao jogo sujo, ou sequer entra em campo. Ser honesto, aqui, é sinônimo de derrota. A vitória é de quem joga com as armas da velha política: cargo, dinheiro, calculadora, promessa e conchavo.
O preço para ser prefeito? Muito alto. Para a cidade, ainda mais caro.